domingo, 26 de setembro de 2010

Reciclagem: Sandálias voltam a ser sandálias

26.09.2010 - 13:45

A utilização de matéria-prima reciclada faz crescer a economia verde, mas a coleta seletiva carece reforço

Juazeiro do Norte e Fortaleza. Chamou nossa atenção, no lixão de Juazeiro do Norte, a separação de sandálias e saltos feitos em PVC e procuramos uma das centenas de empresas que reciclam o material na Região do Cariri. Na Betel, funcionárias terminam de separar o material, que é colocado em uma máquina que lava, seca e mói, transformando aquele lixo em matéria-prima para a fabricação de diversos produtos.

Em uma outra unidade da mesma empresa, são confeccionados aproximadamente 70 mil pares de sandálias por mês, além de solados de sapatos. O proprietário, Severino Gonçalves Duarte, conta que fabrica sandálias desde 1963 e desde 1982 utiliza o material reciclado para fazer os solados. A coleta e a produção da matéria-prima cresceram tanto que ele fornece o insumo para outras empresas e se mostra muito satisfeito com os resultados.

Nova revolução

Em pleno século XXI, o Brasil está acordando tardiamente para uma nova "revolução industrial": a do reaproveitamento do lixo. Com a nova Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), abre-se oficialmente o caminho para a industrialização que reutilize materiais ainda vistos pela sociedade simplesmente como um problema, mas que, na verdade, constituem uma oportunidade de negócios. Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o Brasil jogou, literalmente fora, R$ 8 bilhões em produtos que poderiam ser reciclados em 2009.

No País, são geradas 240 mil toneladas de lixo urbano por dia. Fora o que é jogado diretamente no mato, rios e oceanos, a maior parte vai para lixões (59%) e aterros sanitários (13%). São mais de 200 mil toneladas de resíduos que ocupam espaço, degradam o ambiente, geram doenças.

Hoje, a economia proporcionada com a atividade de reciclagem varia de R$ 1,3 bilhão a R$ 3 bilhões por ano. Apenas 14% da população brasileira conta com o serviço de coleta seletiva. E somente 3% dos resíduos sólidos urbanos gerados nas cidades são coletados nos municípios. A PNRS torna obrigação da União, Estados e municípios elaborar e executar planos para tratar os resíduos sólidos, com novas regras para o manejo desse tipo de lixo e a fixação de metas a serem cumpridas.

"Com a crise de 2009, o valor do material reciclado caiu à metade", revela Ricardo Leite, da coordenação de Meio Ambiente da Prefeitura de Cruz, uma das três cidades no Ceará que desenvolvem programa de coleta seletiva. Para ele, a PNRS será importante, não só para os gestores públicos, como para as empresas e a população: "Há uma resistência cultural, por parte das pessoas; e política, no caso dos gestores, em investir na reciclagem de resíduos".

Conforme dados da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), no Brasil, a geração de resíduos de 2008 para 2009 cresceu cerca de 8%. "E cerca de 43% dos resíduos coletados ainda são encaminhados para destinação inadequada, em lixão ou aterro controlado", avalia o diretor executivo da entidade, Carlos Alberto Vieira Silva. Para ele, se faz necessário conter o aumento da geração e também garantir que a destinação dos resíduos seja totalmente adequada. "Diante deste cenário, nós temos a Política Nacional. Por ela, os municípios terão quatro anos para dar uma destinação adequada aos resíduos. Temos a crença de que algo precisa começar a ser feito urgente", defende. Para ele, um ponto frágil da nova legislação é não apontar fontes de financiamento necessárias a esta adequação.

NOVOS USOS

Habilidade faz lixo virar artesanato

Jijoca. O destino dos sacos de retalho de malha poderia ser o lixão, não fosse a habilidade da jovem Thamilys Miranda de Sousa, de 20 anos, residente no município de Jijoca, litoral oeste, distante 260 Km de Fortaleza. Retalhos, potencial lixo industrial, viram fios coloridos que logo são transformados em bolsas e tapetes de crochê.

"A gente compra de fábricas de Fortaleza", diz, completando que sempre tem ideias diferentes, garantindo não vender peças iguais. A jovem aprendeu o ofício do crochê ainda na infância, com a mãe. Na época, conta, trabalhava com linha de algodão e sequer sabia o significado da palavra reciclável.

Mas os tempos mudaram, observa, afirmando que apareceram outras "novidades". A utilização de malha, sacos de plástico dentre outros materiais servem para aguçar a criatividade das pessoas, tanto na Capital quanto no Interior.

Graças a essa troca de informações, hoje, artesãos de todo o Estado conseguiram diversificar o seu trabalho. "Consegui aprimorar a técnica e uso outros materiais", diz com satisfação a jovem que, cada vez mais, pensa em investir na sua habilidade. Agora, além do crochê feito com fios a partir dos retalhos de malha cortados, Tahamilys usa rolos de material utilizado na revelação de impressões digitais, como fotografias. "É um tipo de rolo", observa, que serve de matéria prima para a confecção de peças em crochê.

Ela conta que as bolsas ficam "lindas", sendo ofertadas nas cores azul, vermelha e transparente. A técnica é a mesma usada no crochê tradicional, feito de linha de algodão, ou mesmo com fios de malha. Graças à habilidade da artesã materiais como rolos e fios de malha viram bolsas que ganham formas, tamanhos e cores diferentes.

As peças são comercializadas em loja, no centro de Jijoca, chamando a atenção principalmente de turistas, que se encantam com a criatividade da jovem. "A gente consegue num estúdio vizinho da minha casa". Assim, o que seria lixo, ganha utilidade e gera renda.

Na periferia de Fortaleza, mais precisamente na Sociedade Comunitária de Reciclagem do Pirambu (Socrelp), o lixo rapidamente se transforma em trabalho e renda. Com um pouco de criatividade, o que antes causava repulsa ou incomodo ganha um novo uso. É o caso dos papéis usados e papelões, que terminam virando objetos de desejo (caixas e embalagens), na mesma cadeia do tão criticado consumo, apontado como um dos vilões das montanhas de lixo que se aglomeram desde canteiros de avenidas, ruas e até aterros sanitários. (IS)

Fonte: Diáriodonordeste

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